2.11.06

30º Reunião Anual da ANPOCS (Por Rafael Arantes)

Caros amigos, entre os dias 24/10 e 28/10, tive a oportunidade de ir assistir á 30º Reunião Anual da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (ANPOCS), em Caxambu, Minas gerais. Quero contar-lhes um pouco como funcionou este encontro e as minhas opiniões sobre ele.

A primeira coisa importante a ser dita é que o encontro da ANPOCS é muito rico. Acontecem variados eventos, discussões e debates ao mesmo tempo, com participação, inclusive, de professores e pesquisadores famosos nas mesas ou as coordenando, como Gilberto Velho, Gabriel Cohn, Renato Ortiz, Chico de Oliveira, entre outros tantos mais ou menos famosos. De fato, é difícil escolher para que evento se dirigir. Os eventos foram divididos em 13 modalidades distintas, a saber, a) Conferências; b) Sessões Especiais; c) Cursos; d) Conversa com o(a) Autor(a); e) Workshop; f) Fóruns; g) Exposições; h) Sessão Fonográfica; i) Sessões de Vídeo; j) Reuniões Especiais; l) Mesas Redondas; m) Seminários Temáticos; n) Grupos de Trabalho. Ocorreram todas estas coisas, além dos lançamentos de livros e da venda de outros tantos, com descontos tentadores, na feira montada no evento.

De uma maneira geral, as mesas redondas eram alocadas pela manhã (9h às 11h), enquanto pela tarde (13h30min as 17h30min), funcionavam os seminários temáticos e os grupos de trabalho. O restante das atividades era alocado nos intervalos entre esses horários, muitas vezes chegando a haver atividades iniciando-se as 21h30min e passando das 23:00h.

Eu posso falar um pouco mais das mesas redondas (MR) e dos Grupos de Trabalho (GT) porque foram as atividades que mais participei. As MR são atividades coordenadas por um ou dois pesquisadores e têm um tema central exposto em seu título. A partir da delimitação do tema, o coordenador é livre para escolher os expositores que têm cerca de 15 min a 20 min para expor os resultados de uma pesquisa ou delimitações teórico-metodológicas, a depender do expositor e do tema da mesa redonda. Em um mesmo horário (9h às 11h), aconteciam de 6 a 11 MR diferentes, nos três dias do encontro (25, 26, 27), visto que no dia 24 houve apenas a abertura e o lançamento de alguns livros.

Já os GT se referem a um tema anteriormente delimitado por um grupo e é aberto para que os pesquisadores, incluindo mestrandos e doutorandos, enviem seus trabalhos. Estes trabalhos são selecionados pelo coordenador e entram na composição da mesa do GT. Os GT são compostos de três sessões, uma em cada dia, que abordam aspectos diferentes de um mesmo campo de estudos. Apenas como exemplo, posso dizer que assisti aos três dias do GT "Cidades: Sociabilidades, cultura, participação e gestão". A primeira sessão tinha como abordagem "Modo de Vida Urbano: sociabilidades e cultura", a segunda "Participação, Política Urbana e Governança Social" e a terceira "Metrópoles: Crises, Vocações, Reconfigurações". Cada GT tem um ou dois coordenadores por dia e um ou dois debatedores. Cada trabalho apresentado é comentado, posteriormente, pelo debatedor, que teve acesso prévio ao paper que foi enviado ao GT. Após ás apresentações e aos comentários, é aberto debate para que a audiência possa se manifestar. Os Seminários Temáticos (ST) também seguiram os mesmos padrões dos GT, com um tema central e três sessões com abordagens distintas. Devo lembrar, ainda, que todos os inscritos na ANPOCS receberam um CD com os papers apresentados nos GT e ST.

Uma outra atividade que achei muito interessante foram as sessões especiais (SE). Houve apenas sete, mas tive a oportunidade de assistir a duas delas. Assisti "Marcel Mauss e as Ciências Sociais", com coordenação de Renato Ortiz (Unicamp) e exposição de Eric Sabourin (UnB) e Paulo Henrique Martins (UFPE) e "Brasil: os próximos anos", com coordenação de Gildo Marçal Brandão (USP) e exposição de Chico de Oliveira (USP), Marco Aurélio Nogueira (UNESP) e Luiz Werneck Vianna (IUPERJ). Das outras atividades, participei pouco por questão de tempo e não posso dar bons depoimentos.

Já lhes disse anteriormente que a reunião da ANPOCS é muito rica e posso dizer, agora, que gostei muito de ter tido a oportunidade de assistir á reunião. De fato, é uma oportunidade incrível para o estudante assistir certos debates e exposições, não apenas de autores consagrados, mas mesmo de mestrandos e doutorandos. Considero uma experiência fundamental principalmente para aqueles que já têm tema delimitado de monografia ou de pesquisa e que podem dialogar com pessoas de outros estados que também trabalham com o mesmo tema. Devo confessar que, no fim, sai com estas opiniões da reunião da ANPOCS, mas, logo de início, acumulei uma série de críticas e insatisfações com o modelo e o conteúdo das apresentações.

O primeiro ponto crítico a ser tocado é que o tempo de apresentação de cada expositor, principalmente nas mesas redondas, é muito pouco. Isso faz com que ou as apresentações partam de um pressuposto de que a audiência já domina, pelo menos em parte, o tema e acabe por excluir dos debates uma parte do público ou faz com que as apresentações sejam demasiadamente superficiais. Acho que essa opinião é partilhada por todos que freqüentaram a ANPOCS ou que freqüentam Mesas Redondas em outros lugares. Todavia, é um risco que todos teremos que correr um dia, visto que não temos e não teremos solução para isto.

Uma outra coisa que me incomodou bastante nas apresentações, principalmente nos títulos dos papers apresentados nas MR, foi o caráter demasiado particularista que os trabalhos assumiram. Os papers e as exposições se pautavam em minuciosos trabalhos empíricos que fez com que, muitas vezes, eu questionasse a relevância daqueles estudos para a sociedade ou mesmo para as Ciências Sociais. Tive dificuldade em enxergar as questões teóricas que norteavam os estudos e mesmo as contribuições de tais estudos para as Ciências Sociais. Não sei, entretanto, até que ponto essa dificuldade é minha, com todas as minhas especificidades de formação acadêmica e individual, ou se é um problema estrutural das pesquisas produzidas no Brasil que, me parecem, apenas aplicam modelos, métodos e teorias importadas, em detrimento de construir seus próprios instrumentos metodológicos e teóricos.

Enfim, minha angústia com a ANPOCS passou quando assisti à MR "Cidade, Cidadania e segmentações sócio-territoriais", com coordenação de Luiz César Queiroz Ribeiro (UFRJ), com exposições de Brasilmar Ferreira Nunes (UnB), Manuel Villaverde Cabral (Univ. de Lisboa) e Márcia Leite (UERJ) e no decorrer do GT sobre Cidades também. Neste momento, pude perceber que, pelo menos, os GT e os ST são compostos por comunicações, ou seja, o objetivo não é construir debates conceituais profundos, mas assistir o que os "nossos" pares (dos mestres e doutores) estão produzindo sobre cada tema, em cada área específica do conhecimento das Ciências Sociais. De fato, posso dizer, aprendi bastante com as comunicações e pude também "catar" nas falas, com um certo esforço, as teorias que nortearam os trabalhos em questão.

Apenas como um comentário, e não sei o motivo pelo qual isto acontece, vi pouquíssimos, para não dizer nenhum, estudos antropológicos fazendo parte da programação. Achei os temas muito mais voltados para a Ciência Política e a Sociologia, embora essa divisão estanque pareça não haver nas práticas de pesquisa social.

Por fim, quero dizer que a experiência valeu muito a pena. Valeu no sentido pessoal e no sentido acadêmico também. Voltei da ANPOCS com uma série de idéias renovadas, com uma série de questionamentos e reflexões sobre as teorias, sobre as pesquisas e sobre as trilhas que seguirei na minha trajetória acadêmica. Com isso, quero dizer que o esforço para participar de um encontro científico é muito válido e que nossa entidade representativa deve se esforçar para possibilitar essa experiência aos estudantes. Quero lembrar a todos que vai haver o XIII Congresso Brasileiro de Sociologia, com tema "Desigualdade, Diferença, Reconhecimento", em Recife, do dia 29/05/2007 ao dia 01/06/2007. Espero que, dessa vez, os estudantes da UFBA possam se mostrar presentes!

OBS: Vou disponibilizar, no DA, a programação dos ST e dos GT e o CD que contêm os papers expostos em cada uma dessas duas atividades para que cada um possa procurar a sua área de interesse e se atualizar com o que está sendo produzido no restante do país.