7.5.07

Carta do NENU sobre as eleições do DCE-UFBA

O DACISO divulga abaixo carta do NENU sobre as eleições do DCE-UFBA. Esclarecemos que o conteúdo desta não é de nossa autoria ou responsabilidade, tampouco as idéias expressas nesta representam as opiniões da entidade estudantil de Ciências Sociais.


NENU – NÚCLEO DE ESTUDANTES NEGR@S DA UFBA

OUTONO DE 2007.

Nos dias 08 e 09 de maio de 2007, ocorrerá o processo eleitoral para a escolha dos representantes discentes para o DCE-UFBA, sob a égide da majoritariedade. Acreditamos que a avaliação da atual conjuntura do movimento estudantil (ME) clássico na UFBA e de suas respectivas posições e programas políticos tornam-se imponentes em vista da composição de quatro chapas para a disputa desta eleição. É um momento em que reflexões, críticas e propostas sobre o papel da universidade pública no âmbito de uma sociedade racializada, desigual e altamente hierarquizada se fazem necessárias, ainda mais em um contexto no qual o debate acerca do projeto Universidade Nova e do Programa de Ações Afirmativas impera.

A crise de legitimidade pela qual passa o ME clássico, lastreada pela carência de representatividade, pelo pragmatismo eleitoral como diretriz hegemônica e pelas eternas rixas entre os grupos políticos, traz a possibilidade de, nesse momento, repensarmos práticas habitualmente usadas por este segmento, propondo, para além da retórica do jogo político, intervenções reais na universidade.

O contato do NENU com cada uma das chapas, em momentos distintos, permite a concretização da análise destas e de seus programas. Temos em mente que, mesmo partindo de perspectivas histórico-civilizacionais diferentes, o debate político pode ser construído efetivamente. Trazemos a expectativa de mudança da práxis política destes grupos, notadamente no que se refere às demandas sociais historicamente reprimidas da população negra na estrutura universitária branca, eurocêntrica e racista.

A chapa 1, formada pelos grupos Quilombo (Articulação de Esquerda-PT) e Kizomba (Democracia Socialista-PT), traz como pautas o debate racial, o reconhecimento das desigualdades historicamente acumuladas contra a população negra, a assistência estudantil vinculada à política de ações afirmativas, uma concepção de universidade democrática e popular, entre outras. Em relação a essa chapa, é necessário pontuar que, embora o discurso acerca do debate racial tenha avançado desde 2003, há limitações ideológicas próprias do marxismo-leninismo, que impedem uma construção efetiva de um programa referente à questão racial para além da retórica política. Isso não deslegitima, dentro dessas limitações, as discussões ora pretendidas. Contudo, é importante assinalar a ausência política da Quilombo durante os dois últimos anos, exatamente quando o debate acerca da efetividade do programa de ações afirmativas, sobretudo da permanência, necessitava ser aprofundado. A Kizomba, integrante da chapa e também ausente do ambiente político, não evidenciou um histórico de debate racial, o que nos leva a crer na hegemonização da Quilombo, no que concerne à estruturação do conteúdo programático da chapa, relativo a esse ponto.

A chapa 2, formada pela UJS (PC do B) e pela Flores de Maio (Articulação-Unidade na Luta – PT), traz um histórico nebuloso. A Flores de Maio, durante a greve de 2004, esteve de mãos dadas com a Reitoria da UFBA, estabelecendo com esta uma promiscuidade ainda persistente e não totalmente explicada, além do fato de pertencer ao Campo Majoritário do PT, que possui práticas nitidamente de direita, e nunca ter externalizado sua postura frente ao conjunto de ações afirmativas. A UJS, ainda durante a greve de 2004, realizou uma política de estreitamento de relações com a Administração Central da UFBA, ao ponto de desrespeitar deliberações da Assembléia Geral dos Estudantes no momento em que retirou o seu nome da lista de autoconvocação do CONSUNI, para discutir as pautas da greve, tentando inviabilizá-la. Embora a UJS tenha demonstrado uma boa compreensão acerca das políticas de ações afirmativas da UFBA ─ sendo posta, segundo ela, como uma política não somente da juventude, mas também disputada no partido ─, é duvidoso que essa compreensão possa ser hegemônica dentro do PC do B. Esse questionamento é evidente, pois a prática do partido, em nível nacional, vai de encontro frontalmente às ações afirmativas com recorte racial, no anacrônico debate reducionista de classe, o que nos leva a crer que a dita posição na Bahia seja contra-hegemônica no partido.

A respeito da chapa 3, composta por membros da antiga gestão O Coletivo e por outras pessoas, compreendemos a necessidade de fazermos uma análise mais minuciosa. A Gestão O Coletivo representou para o ME clássico um retrocesso político sem precedentes, pois imobilizou as principais pautas da universidade; ficou propositadamente inerte frente às ações afirmativas, burocratizou enormemente a estrutura do DCE-UFBA, impedindo sequer a participação dos outros grupos políticos; foi pífio em propor políticas de assistência estudantil e votou contra a Pró-Reitoria de Ações Afirmativas, colocando, então, o movimento estudantil num ostracismo político durante os últimos dois anos. Esse, portanto, foi o legado deixado por este grupo na universidade. O voto contra a Pró-Reitoria de Ações Afirmativas demonstra que a questão racial não tem importância na sua agenda política, deixando evidente que esta briga não se resume apenas a um nome (Pró-Reitoria de Ações Afirmativas ou Pró-Reitoria de Assistência Estudantil), mas a uma postura político-ideológica da direção do DCE-UFBA de não enfrentamento de uma questão estrutural que norteou a formação das relações sociais no país: o racismo, dentro e fora da universidade. Não podemos deixar de pontuar que O Coletivo se elegeu em 2005 com um discurso de apartidarismo e de autonomia do ME frente a partidos políticos, muito embora, já desde aquela época e mais intensamente hoje, seja integrante da Juventude e Revolução, da corrente interna do PT denominada O Trabalho. É certo, pois, que o discurso do apartidarismo é uma falácia e uma fraude política. Perante essa nova disputa eleitoral, os remanescentes do Coletivo esquecem este contexto em que deixaram o ME, com um discurso de que a Coletividade e Luta é um grupo diferente do Coletivo, mas não deixam de pontuar as maravilhas (sic) da gestão anterior. Isso denota o quão oportunistas são os membros desta chapa, notadamente os integrantes do D.A. de Educação Física, cabeças da chapa (a história é vigilante). Quanto ao conteúdo do programa da Coletividade e Luta, notamos uma perspectiva universalista e abstrata do estudante, dentro da noção anacrônica de classes, deixando de lado as especificidades da formação sócio-racial do país e suas implicações no processo educativo. A omissão em relação ao debate de Universidade Nova e de Ações Afirmativas mostra o nível de miopia política da chapa frente ao atual contexto da universidade. POR TUDO ISSO, VOTAR NA CHAPA COLETIVIDADE E LUTA SE CONFIGURA COMO UM ERRO HISTÓRICO.

A chapa 4, composta pela Contraponto (APS-PSOL), pela juventude do PSTU e por outras pessoas, demonstra um bom nível de qualificação teórica, um programa minimamente elaborado e uma disposição de diálogo no que se refere ao programa de Ações Afirmativas. Contudo, o debate acerca da questão racial ainda se mostra um pouco incipiente, sem um quadro definido. É de se pontuar que a participação de membros do Diretório de Medicina (DAMED) nos deixa apreensivos, uma vez que o DAMED sempre demonstrou ser altamente oportunista, compondo anteriormente a chapa do Coletivo, além de ser, em diversas oportunidades, contrário ao Programa de Ações Afirmativas da UFBA (a história é vigilante). É ainda duvidosa a mudança de postura dos integrantes do DAMED. Acreditamos ainda que a falta de um maior espaço político dos membros que compõem a chapa possa ser um empecilho para a efetivação das políticas descritas no seu programa.

O NENU, um grupo afrocentrado por paixão e atuando dentro e fora da universidade desde 2003, parte de uma perspectiva político-ideológica e civilizacional distinta da concepção eurocêntrica que lastreia o ME clássico (o marxismo nas suas mais variadas vertentes), que tem esses espaços de atuação UNE/DCE como pontos referenciais de atuação política. Isso não impede que eventuais debates e diálogos possam ser feitos, como os foram nas conversas com as chapas em momentos distintos. Entretanto, sempre pontuamos que esta posição. NÃO REPRESENTA, DE FORMA ALGUMA, APOIO EXPLÍCITO OU IMPLÍCITO A QUALQUER DAS CHAPAS.

O NENU ainda pontua que o ostracismo político pelo qual passou o ME clássico frente às demandas da universidade nesses dois últimos anos não é fruto apenas da incompetência do Coletivo, mas, sim, do conjunto das forças políticas que compõem o DCE-UFBA, que não se fizeram presentes na gestão anterior.

Diante das razões expostas anteriormente, explicitamos que a posição do NENU em relação às eleições do DCE-UFBA é pelo VOTO NULO. Essa posição não significa que desconsideramos o próprio diálogo que nos propusemos a fazer. Mas, ao contrário, reconhecemos que esse espaço de debates se configura, por essência, como um campo político que porventura poderá vir a concretizar a ação política que contemple as nossas demandas historicamente negligenciadas, atendendo, assim, às expectativas geradas pelo processo de diálogo.

ANI LATI SE IDAJO
AGBARA DUDU
AXÉ